quarta-feira, 13 de maio de 2009

A condição humana
DRAUZIO VARELLA

COMEÇAM A ser identificados os genes que codificam as características exclusivas da espécie humana. Os chimpanzés e nós descendemos de um mesmo ancestral que viveu até 6 milhões de anos atrás, época em que divergirmos deles, geneticamente. Somos tão próximos, que seríamos considerados seres da mesma espécie, caso adotássemos para os primatas os mesmos critérios usados para classificar os pássaros, por exemplo.
O fato de compartilharmos cerca de 99% dos genes não é de surpreender, dadas a existência do ancestral comum e as semelhanças de aparência física, constituição bioquímica e até de relacionamento social. O que intriga é como 1% de diferença basta para explicar porque eles dormem em árvores, enquanto nós construímos cidades.
Assim que o genoma do chimpanzé foi sequenciado, vários grupos se dedicaram a comparar os 3 bilhões de pares de bases (representadas pelas letras do alfabeto A, G, C e T) contidas no nosso DNA e no deles.
A tarefa tem sido levada adiante por meio de programas de computador que "escaneiam" ambos os genomas à procura dos trechos em que as bases A, G, C e T estejam ordenadas de forma diversa.
A conclusão é que as diferenças se acham confinadas em trechos de DNA formados por apenas 15 milhões de bases.
Nesses estudos começam a emergir alguns genes, reunidos em uma revisão escrita por Katherine Pollard, da Universidade da Califórnia, na revista "Scientific American".
O primeiro deles foi HAR1, gene ativo em alguns neurônios cerebrais.
Esse gene é encontrado em todos os vertebrados, mas em galinhas e chimpanzés (espécies que divergiram há 300 milhões de anos) as diferenças são mínimas: cerca de 2%. Já, entre nós e os chimpanzés (espécies que divergiram há 6 milhões de anos) elas ultrapassam 10%.
HAR1 é um gene ativo num tipo de neurônio essencial para o desenvolvimento do córtex cerebral, a camada mais externa do cérebro, cheia de reentrâncias e saliências, nas quais se acham entranhadas as atividades cognitivas que nos permitem compor sinfonias.
Quando HAR1 sofre mutações podem surgir doenças congênitas eventualmente fatais, como a lisencefalia, enfermidade na qual a parte externa do cérebro fica lisa, sem as reentrâncias e saliências características do córtex humano.
Outro gene que mostrou diferenças significativas com o similar em chimpanzés foi FOXP2, envolvido numa das mais importantes características humanas: o domínio da linguagem. Quando ocorrem mutações em FOXP2 as crianças perdem a capacidade de executar determinados movimentos faciais necessários para a articulação da palavra.
Mas, o que distingue a fala humana das vocalizações empregadas na comunicação entre outros animais, não são simplesmente as características do aparelho fonador, mas o tamanho do cérebro. Nos últimos 6 milhões de anos, o volume de nosso cérebro mais do que triplicou.
Um dos genes envolvidos nesse processo é ASPM, que, quando defeituoso, leva à condição congênita conhecida como microcefalia, na qual o cérebro chega a ficar reduzido a 70% de seu volume.
Nem todas as características unicamente humanas se acham restritas ao cérebro, no entanto.
A conquista do fogo há 1 milhão de anos e a da agricultura há 10 mil anos criaram oportunidades de acesso farto aos carboidratos. As calorias disponíveis nesses alimentos só puderam ser aproveitadas porque no genoma humano surgiram múltiplas cópias do gene AMY1, responsável pela produção de amilase na saliva, enzima essencial para a digestão dos açúcares.
Outro exemplo é o gene LCT, responsável pela produção da lactase, enzima encarregada da digestão da lactose, o açúcar do leite que os mamíferos digerem bem apenas na infância. Mutações no genoma humano, ocorridas há 9 mil anos, produziram versões de LCT que tornaram possível a digestão de leite também na vida adulta, ampliando as possibilidades de sobrevivência em tempos de penúria.
Descobrir a estrutura e as funções desses e de outros genes com mutações exclusivas da espécie humana, ocorridas ao acaso e submetidas ao crivo da seleção natural através da competição pela sobrevivência, permitirá conhecer a organização das moléculas que deram origem à condição humana.
Não é mais instigante do que aceitar a ideia de que o homem seria fruto de um sopro divino e a mulher criada a partir de sua costela?
Folha de São Paulo, sábado, 09 de maio de 2009. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq0905200931.htm

2 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Acreditar em uma verdade não justificada, ou seja, poder observar aquilo que já está pronto há décadas como à religião, pois é fundamentada em dogmas é bastante intrigante, não estou negando Deus, mas apenas questionando o que o homem criou a partir de algo surpreende para a época de Jesus Cristo. Alguém como Jesus Cristo, além de sua época, pôde levar um sentimento á mais em pessoas, o sentimento de que todos são iguais. Porem ainda contexto alguns dogmas apresentados por diversas religiões, porque é algo muito irreal, e muitas religiões dizem que é preciso pagar para ir pro céu. Então, até que ponto acreditam que Deus não quer pagamentos, mas sim que você seja uma pessoa melhor do que ontem.
    Questionar isso é mais uma influencia para apoiar a ciência. Mas também aceitar que viemos dos macacos, conclui – se então que os macacos estariam evoluindo até hoje, será que alguém já viu um macaco meio homem por ai? E aceitando essa implicação seria nós estarmos negando que Deus criou a raça humana. É mais intrigante acreditar que viemos de um chimpanzé, por apresentar semelhanças incríveis, mas também é tanto quanto questionável como os dogmas religiosos, pois até hoje não provamos a existência de um macaco meio homem.
    A final, tudo é tão questionável, é preciso distinguir certas hipóteses, para que haja uma melhor compreensão de todas as perguntas, mas mesmo assim, a pergunta “porque eu estou aqui” é bastante persistente. Crer no provável ou improvável?! ... Eis a questão!?


    Amanda Reis Gomes 1º I - Sagrado COC - Araguari

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